sexta-feira, junho 10, 2011

A Islândia e a Tugalândia



Ali à beirinha do Círculo Polar Árctico, entre os vulcões e as focas, encontra-se a minúscula Islândia, com uma população um pouco maior que a ilha de Malta e um pouco inferior à do Luxemburgo, ou seja, em números redondos qualquer coisa como 320.000 habitantes. Os islandeses, como se sabe, estiveram a um passo da bancarrota em 2008, com a quebra dos 3 principais bancos comerciais (Kauthing, Glitnir e Landsbanki), na sequência das dificuldades que experimentaram em refinanciar as respectivas dívidas a curto prazo e com uma corrida aos depósitos no Reino Unido.
Para além de desalojarem o executivo então em funções por responsabilidades na gestão da crise – até aqui as semelhanças com a crise lusitana são evidentes -, os islandeses foram bem mais longe atribuindo culpas ao Primeiro-ministro Geeir H. Haarde e aos banqueiros, entre eles Sigurdur Einarsson, CEO do Kauthing, o maior banco comercial do país. A Procuradoria Geral da República da Islândia, com base num relatório de uma comissão parlamentar, considerou que o Chefe do Governo actuou com “extrema negligência” no dealbar da crise e respectivas sequelas e que, pior do que isso, ocultou informação aos  cidadãos e aos membros do seu próprio gabinete sobre a gravidade da situação na base das informações de que dispunha. O certo é que um tribunal especial encetou, há dias um procedimento criminal contra Haarde que dispõe de relativamente pouco tempo para preparar a sua defesa. Pensa-se que o julgamento terá início pouco depois do Verão.
            As instituições de Bretton Woods, designadamente o FMI, adiantam que a crise islandesa está a chegar ao fim e que a recuperação já se iniciou. Não obstante, a imagem do país degradou-se de uma forma acentuada e presumivelmente para sempre. Trata-se, pois, de um dado estrutural e não meramente conjuntural.
            De salientar que  a Islândia optou por uma fórmula algo inédita de lidar com a crise, não injectando dinheiro nas instituições financeiras locais e levando tranquilamente a banca à glória e demandando em justiça os banqueiros, os especuladores e alguns políticos, acusados de terem arruinado o país. O facto de Einarsson ter sido detido e que se tenha aberto um processo contra Haarde parece demonstrar inequivocamente de que não se está perante um “show” para inglês ver mas antes de um processo sério que os islandeses querem levar até ao fim.
            Os islandeses sofrem na pele, como todos os demais, as agruras da crise, com o seu cortejo de misérias de sobrecargas de impostos, de cortes salariais, de redução das pensões, de desemprego, etc., mas têm pelo menos o supremo gozo de verem os principais responsáveis responderem perante a justiça.
            Como refere Paul Krugman no “New York Times” de 30.05.2010: And in the process of building short-lived financial empires, a handful of operators built up enormous debts that their fellow citizens are now expected to repay. É este o cerne da questão.
            Com grandes dificuldades, obviamente, a Islândia está a superar a crise, o que constitui uma lição para nós e para os demais países periféricos a braços com a crise da dívida soberana.
Todas as crises são diferentes mas têm muitos pontos de convergência.  A Islândia não caucionou a irresponsabilidade e o crime e fez sentar no banco dos réus tutti quanti. A diferença fundamental está precisamente aqui.
Será que um dia teremos a coragem para fazer o mesmo? E quem serão os arguidos, para além, obviamente de Sócrates y sus muchachos. Alguém está em condições de apresentar uma lista?


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