sábado, maio 01, 2010

Crise? Qual crise? A never-ending story - 



Crise, uma pequena contribuição para o debate de ideias: - Em resposta a correspondência recente que recebemos, vamos entrar num diálogo aberto, ao estilo de apontamentos dispersos. Antecipadamente, pedimos que nos perdoem por alguma falta de estruturação neste debate.
Começo por  dizer que sou um dos mais acérrimos críticos da situação portuguesa  (política, finaceira, económia e social) e do estado a que isto chegou. Não defendo nada, nem ninguém, apenas as minhas ideias das quais não abdico.
Neste jogo de futebol em estamos a perder por 5 a 0 e em que o árbitro invalidou um golo nosso por um fora de jogo inextistente, revelaria falta de honestidade o dizermos  que perdemos o jogo por culpa do árbitro. Além disso, seria uma tontice que nos descredibilizaria. Se perdemos por 5 a 0, tenho de aceitar a derrota e se perdessemos por 5 a 1, perdíamos na mesma e bem. Não me considero mau perdedor. Só que existe um movimento especulativo contra Portugal, um ambiente negativo e malsão (é certo que nos pusémos a jeito para apanhar no toutiço) , complementado por uma tentativa insidiosa de arrastamento para o mesmo buraco da Grécia, quando se sabe - e os factos são indesmentíveis - que as situações são diferentes.
A teoria da conspiração, isto é de que há um complot liderado pelos EUA e acolitado pelos BRICs contra o Euro e contra a Europa,  não é paranóia, assenta em certos pontos que começam a emergir com nitidez. Para mim é uma questão intuitiva, mas, por ora, não o consigo demonstrar. Só o tempo me dará ou não razão. O certo é que as agências de rating têm tido um comportamento ostensivamente negativo sem distinguirem situações: por exemplo, o problema do desemprego espanhol é uma questão estrutural da economia espanhola e não dos demais países, as falcatruas gregas são falcatruas gregas e não portuguesas ou eslovacas, as propostas obras faraónicas são lusitanas, etc. etc. Ora, na sua actuação as agências de rating aceleram as movimentações do mercado em determinados sentidos, sem cuidarem se esses caminhos estão certos, se não vão agravar situações já de si difíceis e se prevalece alguma moralidade na respectiva actuação. Poder-se-á argumentar que o sistema não tem espaço para estas coisas. A minha opinião política sobre o assunto é exactamente a oposta: temos de actuar, temos de reformar as agências de alto a baixo, criando entidades sérias e credíveis. Mais. Como sempre pensei e continuo a pensar, tem de existir algum controlo por parte do estado sobre o sector bancário, essencialmente, porque a Europa, para além de um projecto politico em construção é um vasto espaço social e não pode ficar á mercê das constantes variações de humor do capitalismo e das leis inexoráveis do mercado. Entendo que o capitalismo  na sua forma selvagem tem de ser banido. Aliás, a grande crise que ainda estamos a viver deriva de uma ausência de Estado que impeça as manobras especulativas da bolsa e as manipulações com os chamados produtos tóxicos. Foi esta ausência de Estado, de Controlo e de Poder arbitral que conduziu à presente situação. o Estado demitiu-se das funções. Porque é que Washington actuou (ainda que tardiamente) e da forma em que o fez?
Quanto à Alemanha, discordo que seja apontada como o único “mau da fita”, ela peca sobretudo, por indiferença e por egoísmo “nacionalista”. A  meu ver, os verdadeiros “maus da fita” são "actores" europeus que fazem, sempre fizeram e continuarão a fazer,  o jogo do outro lado (britânicos e outros parceiros menores) e, claro está, o "Outro Lado", no seu magnífico esplendor. Sejamos meridianamente claros: Não interessa ao mundo anglo-saxónico a existência da Europa como uma entidade própria, com a sua personalidade jurídica bem definida, o seu poder político e militar e a sua pujança económica e financeira. Isso está fora de questão. Paranóia? Mania da perseguição? Julguem pelos factos, passados, actuais e, sobretudo,  vindouros.
Em toda esta problemática, a Alemanha, por miopia,  está a cuidar dos seus interesses e apenas isso. É precisamente esta questão  que se pretende alterar em nome da construção da Europa. Se os gregos se portaram mal é chamá-los ao bom caminho. O projecto político tem de ser o primeiro objectivo e o somatório de egoísmos nacionais (de que a Alemanha, França, RU, Itália, etc. são exemplos) tem de ser combatido. 
Quanto à solidariedade intra-europeia que deve existir, antes do mais tem de se delinear num primeiro palco nacional. A melhor prova disso foi a solidariedade que todo o Povo português patenteou de forma claríssima em relação à Madeira e que ainda continua, nos supermercados, nas lojas, nas ruas, etc. Há países artificiais em que pode não haver  solidariedade interna: neste particular, os exemplos catalão ou lombardo são relevantes, porque estes povos se consideram a si mesmos como não integrando o respectivo pais mas sim outra nação. A  meu ver são excepções precisamente porque a Espanha e a Itália são países em que a verdadeira unidade nacional ou nunca existiu (Espanha) ou são de formação recente e nunca se formou (Itália).  A queda do muro de Berlim e a consequente reunificação alemã foi o acontecimento mais marcante dos finais do século XX. A solidariedade intra-nacional era -e é - imperativa, absoluta, categórica, indiscutível. Não o foi. É uma chaga que para mim ficou sempre a manchar uma das páginas mais belas e exaltantes da minha época. Pergunte-se ao homem da rua em Bremen ou em Frankfurt  porque é que na altura não queria pagar mais impostos, à semelhança de muitos outros alemães, pela reunificação...Agora e independentemente de outros considerandos (alguns válidos) , se os alemães não são solidários entre si, como poderão sê-lo com os outros? 
Em conclusão, sou categórico: a solidariedade europeia tem de ser um objectivo a alcançar no imediato.  
Se o Euro não tem condições para continuar - e pelos vistos talvez não tenha - então temos de mudar de rumo e mandar à fava o projecto europeu
Finalmente, tenho que dar a mão à palmatória, nesta crise e no caso português,  80 ou  90% do problema é nosso, mas existem 20 ou 10% que merecem uma análise mais aprofundada. Foi o que pretendi fazer, sem complexos e com perfeita abertura e  espírito construtivo, mas crítico.
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